Inocência branca, apagamento negro: analisando Alcindo (2020) contra as ficções da bonomia colonial portuguesa
DOI:
https://doi.org/10.48487/pdh.2023.n16.31177Palavras-chave:
Branquitude, Raça em Portugal, Lusotropicalismo, História Negra, Negritude em PortugalResumo
Este ensaio usa o documentário de Miguel Dores, Alcindo (2020) para propor uma crítica do conceito de “branquitude” em Portugal. O ensaio defende que a insistência em narrativas de excecionalismo lusotropical e colonial em Portugal forma um veículo de continuidade entre o regime “colonial-fascista” português e a democracia liberal implantada depois da revolução de 1974. O assassinato de Alcindo Monteiro (1995), o centro da intervenção fílmica e etnográfica de Dores, oferece um microcosmo destes paradoxos da autorrepresentação portuguesa. Ao tornar a raça num factor inexistente, o lusotropicalismo cumpre um papel instrumental para a sustentação de ficções da inocência colonial portuguesa. O branqueamento da história da revolução de 1974 é, aqui, particularmente significativo. Em busca de novas narrativas, o novo regime forjou a imagem de um país futuro através excisão de África das suas narrativas sobre o passado, assim confinando a história nacional ao estado-nação estritamente europeu. Esta amnésia deliberada tornou séculos de dominação colonial “esquecíveis,” deste modo desnaturalizando o conceito de raça e a subalternização negra do imaginário do Portugal contemporâneo.